Café...tudo de bom!

12.12.12

A MENINA DO DRAGÃOZINHO QUE FAZIA MAGIA

Em meio ao silêncio, soaram uma leves pancadinhas na porta...  
Tão suaves eram, que pensei serem engano dos meus ouvidos. 
Levantei a cabeça do caderno em que escrevia, e: “Toc-toc-toc”- de novo! 
Levantei-me e fui ver.  
Espreitando pelo olho de vidro da porta: Nada! 
“Toc-toc-toc” - As pancadinhas soavam baixinho, mesmo do outro lado da madeira, que coisa! 
Abri a porta, curiosa. Vi uma menina, de vestidinho cor-de-rosa, fora de moda, como os da minha infância: Franzido na cintura, manguinhas curtas de balão, um grande laço atrás. Cabelo cortado a direito, olhinhos castanhos enormes, líquidos de inteligência e vivacidade. 
Sorri. Ela sorriu também e foi como se tivesse sido derramado entre nós um perfume de alfazema! 
Sem ter de lhe perguntar, já ela ia respondendo num gesto: estendeu os braços, segurando nas mãos ambas um cesto de vime redondo, com tampa. 
- Dás-me um Euro se te mostrar o que tem dentro? - murmurou. 
- Claro que dou, disse eu! E uma fatia de bolo! 
- E uma laranja fresquinha, tens? 
- Tenho sim! Posso arranjar um lanchezinho e arrumá-lo no teu cesto. 
- Não! Não podes! 
- Porque não posso? 
- O cesto está ocupado, não te disse antes?  
Só o abro se me deres um Euro! 
- Pronto, pronto! – Disse eu. E ia voltando costas, a caminho da cozinha... 
- Ei! – Disse a menina, antes que eu sumisse – e o Euro? 
- Já te dou; vou à cozinha. Entra, se quiseres! 
- Não quero. Quero um Euro e uma laranja fresquinha.  
Depois, muito baixinho: - E a fatia de bolo. Cheira tão bem!  
Fizeste-o agora mesmo, não foi? 
- Foi! Tirei-o agora mesmo do forno. 
- Então dás-me duas fatias? 
- Tens muita fome? Queres um copo e leite? 
- Não. Leite com laranja azeda, não sabes? Só quero o que combinamos. 
- Ai, ai, que teimosa me saíste! Vou procurar a moeda.  
Primeiro a moeda ou o lanche? 
- Primeiro a moeda! – Afirmou, quase arrogante. 
- Por que primeiro a moeda? 
- Porque estraga mais depressa. 
- Estraga-se mais depressa do que a laranja e o bolo? – estranhei. 
Como me explicas tu isso? 
- Ah, eu explico: é que daqui a pouco já quase nada se compra com um Euro. 
- E que vais tu comprar com o Euro? 
- Não sei. Vou dá-lo à minha mãe, que está sempre a dizer isto ao meu pai. 
E o meu pai discute com a minha mãe. 
Por isso tenho pressa. Preciso muito do Euro! 
Dei-lhe a moeda. Abriu o cestinho.  
Dentro, um dragãozinho de plástico verde e amarelo. 
Arregalei os olhos, pasmados. 
Ela levantou o brinquedo e juntou a nova moeda a outras que estavam no fundo. 
Fechou cuidadosamente o cesto e disse séria: 
- Sabes? Assim o meu dragãozinho faz magia. 
- Pois faz – concordei! Se pedires um Euro a cada pessoa... 
- Vês, como percebes? Já não era sem tempo... ufa! 
- E porquê a laranjinha fresca? 
- Para a minha mãe, que espera um bebe e precisa de vitamina. 
... Fui para a cozinha, estendi um pano na bancada, assentei um prato no meio e arrumei nele bolo, fruta, pacotinhos de sumo.  
Atei as pontas em cruz, como vira tantas vezes a minha mãe fazer, que nunca deixava um pobre sem um prato de comida. 
Tinha-me esquecido da força da solidariedade silenciosa, no deserto de cimento onde berram de todos os lados: Compre! Compre! Compre! 
E nos agridem a cada instante com preços, com cotações, promoções, anúncios de bens supérfluos.  
Nos assustam e envenenam com apelos ao consumo desenfreado. 
No oposto, a suavidade de um “toc-toc-toc” na porta. 
Uma menina com vestido cor-de-rosa e um dragãozinho de plástico que faz magia pelo modesto preço de um Euro. 
A inteligência ensinando a todos o modo sublime de contribuir para a paz. 
Maria Petronilho 
abçs,

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