ROSTOS DE UMA ESTIAGEM
Nós estamos sequiosos
de oferendas divinas,
ausência de bons invernos
em baixadas e colinas
faz o nosso sertão feio
afugentando gorjeio,
despindo nossas campinas.
As nuvens estão sovinas,
o céu está avarento,
o espaço está envolto
num largo lençol cinzento
que muda o rumo da chuva
e é ver um véu de viúva
no rosto do firmamento.
... Sem mais nenhum alimento
roendo paus no cercado,
parecendo esqueletos
faz pena se olhar o gado
faminto cambaleando
quem vê fica imaginando
um fantasma embriagado..
Pouco alento e descorado
foice ao ombro e um boné
de casa para o roçado
meia légua tira a pé
o lavrador de esperança
que estica a confiança
ao dia de São José.
Tem gente que perde a fé
vendo este verão nefasto,
os silos sem ter mais grãos,
os campos todos sem pasto,
mugir dorido ao terreiro
e o criador sem dinheiro
pra garantir tanto gasto
Berros ecoam no pasto
em tom de lamentação,
poeira faz caracol
subindo na amplidão,
neste quadro de aspereza
um tecido de tristeza
veste a alma do sertão
E para indignação
do homem da agricultura
nos surrões não tem farinha,
nos litros pouca gordura,
na lata pouco feijão
e a água no cacimbão
com cem palmos de fundura
Aumenta mais a agrura
do camponês descontente
é ver ao invés de nuvens,
constelação reluzente
enfeitando a madrugada
como cortina bordada
na janela do nascente.
Dideus Sales
abçs,
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